CRÔNICA
Conheci o menino que carregava água na peneira em 2003. Na
época, eu cursava a 6ª série (atual 7º ano) do ensino fundamental na Escola
Francisco de Assis Leite, em Salitre (CE). Ganhei cinco exemplares da coleção
“literatura em minha casa” composta por obras de poesias, contos, novela,
clássico literário e teatro.
Nas primeiras páginas da leitura de “Palavras de
encantamento” (volume 1), deparei-me com Manoel de Barros que afirmou que ter
“um livro sobre águas e meninos”, mas que gostou “mais de um menino que
carregava água na peneira”.
A leitura desse poema despertou minha paixão pela poesia. E
dois anos depois comecei a produzir meus poemas. Assim, como Manoel de Barros,
a inspiração vinha de eventos simples do cotidiano. E se Manoel “roubava um
vento e saia correndo com ele para mostrar aos irmãos”, eu também aprendi a
“catar espinhos na água e criar peixes no bolso”.
A criatividade do menino Manoel era evidente. Por ser “ligado
em despropósitos, quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos”. Também começou
a fazer peraltagens com as palavras. Modificou a tarde botando uma chuva nela e
interrompeu o voo de um pássaro botando ponto no final da frase.
Manoel fazia prodígios com as palavras. Fez uma pedra dar flor! Seus poemas infantis, encantam pela simplicidade vocabular permeada de figuras de linguagens. As comparações e metáforas enriquecem a narrativa numa prosa poética leve que prende a atenção do leitor.
Aprendi a usar as palavras também. Comecei a gostar mais do vazio do que do cheio. Percebi que, assim como Manoel de Barros, vou carregar água na peneira a vida toda, pois “o mundo que eu crio na escrita compensa o que o mundo real não me oferece e eu preciso manter o espírito de revolta vivo em mim.”
MORAIS, José Roberto. Manoel de Barros: o menino que carregava água na peneira. In Revista Sarau. vol.4. nº 11. nov/dez, 2024. (p.19) ISSN 2965.6192