domingo, 27 de janeiro de 2019

GALOPE À BEIRA DO MAR


Nasci e sou filho do meu sertão
Todo dia acordo logo cedinho
Estou morando no sítio Tanquinho
Acordo ouvindo no rádio a canção
Nos açudes, sapos fazem refrão
No juazeiro, bem-te-vi a cantar
Todo sertanejo pode observar
Limpando a roça para obter fartura
Com a chuvada a safra está segura
Nos dez de galope à beira do mar

Fui criado plantando mandioca
Milho, fava, feijão e algodão
Morando aqui no querido sertão
Eu comia da goma a tapioca
Do milho que mãe fazia pipoca
Nas novenas comia mungunzá
Noutras casas havia o vatapá
Depois que terminava as orações
Hoje guardamos as recordações
Nos dez de galope à beira do mar

Dos namoros de infância estou lembrado
Das cartas que escrevíamos na escola
Das brincadeiras e jogos de bola
Daqueles beijos dentro do mercado
Dos sorrisos, do abraço apertado
Dos lugares onde ia te encontrar
Na biblioteca pra disfarçar
Demorávamos um livro escolher
Pois eu estava ali só pra te ver
Nos dez de galope à beira do mar

Lembrando das leituras que já fiz
“Bisa Bia” e “Histórias pescadas”,
“Macaco malandro”, “Águas passadas”
Outras estórias com final feliz
“Sopa de pedra”, “O réu e o juiz”
Os contos e crônicas pra contar
Os versos de cordel a declamar
São obras de autores reconhecidos
Li e leio pra não ser esquecidos
Nos dez de galope à beira do mar.

Sítio Tanquinho, 27 de janeiro de 2019

sábado, 5 de janeiro de 2019

O MIMIMI DOS HIPÓCRITAS


Nessas redes sociais
Reinando hipocrisia
A guerra no Ceará
Destruindo a alegria
Muita gente “preocupada”
De forma até disfarçada
Pela roupa que vestia

Azul, rosa ou amarela
Se te veste fica bem
Preocupa-te com coisas
Que algo relevante tem
A cor da roupa que veste
Ou palavras que disseste
Não interessa a ninguém

Acho que esse “mimimi”
Porque a ministra falou
Já passou dos seus limites
Pois nada modificou
Se fosse rosa vestir
Ou azul pra encobrir
Não havia outra cor

Deixe de hipocrisia
Procure algo pra fazer
Vai assistir um filme
Ou pegue um livro pra ler
Roupa não é problema
Acho que esse dilema
Foi por perder o poder

Vejo o nosso Ceará
Com paralelo poder
A máfia do tráfico está
Reinando e fazendo ver
Já o mimimi reinando
Muita gente ‘tá falando
Preocupando-se por quê?

Se o homem ou a mulher
Rosa ou azul vai vestir?
Veste-se laranja ou verde
Branco, ou cor que servir
Anil, lilás, violeta
Roxo, cinza ou preta
Ninguém deve intervir

Deixe de hipocrisia
Algo útil vai fazer
Essas ideias idiotas
Só cansa a gente de ver
Tanta coisa interessante
Deixe de ser ignorante
Meu conselho pra você.

Sítio Tanquinho, Araripe, CE
05/01/2019

quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

A SANTIDADE DA MORTE


A santidade da morte
encheu de paz teu semblante,
e eu já não podia ver-te
de minha memória diante,
mas no sossego inerte
e glacial daquele instante.
No caixão escasso,
de ceras à luz fátua,
tinha teu rosto ambíguo
quietude augusta de estatua
em um sarcófago antigo.
Quietude como eu não sei o que
de doce e meditativo;
majestade do que eu era;
repouso definitivo
de quem já sabe o porquê.
Placidez, honra, submissa
à lei; e na gentil
boca breve, um sorriso
enigmático, sutil,
iluminando indecisa
a cor da pele de marfim.
A pesar de tanta pena
como desde tanto sinto,
aquela visão me enche
de suave lembrança
e unção..., como quando sonha
o corte de algum convento
numa tarde serena...

Tradução: José Roberto Morais
NERVO, Amado. La santidad de la muerte.
In “Antologia poética”. Ediciones del Sur.
Córdoba. Argentina. Octubre de 2003.